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quarta-feira, 24 de outubro de 2012

.As conventuais “gargantas-de-freira” resistiram ao Novo Acordo?

Como vimos ontem, o papo-seco, verdadeira instituição nacional, sobreviveu intacto ao Novo Acordo Ortográfico. Aquele hífen vai continuar a confortar-nos a alma linguístico-gastronómica.
Concentramo-nos agora nas intensas, irresistíveis, deliciosas e pouco conhecidas “gargantas-de-freira”.


A imagem borbulhante das "gargantas" veio dAQUI.
 
Citando o sítio www.docesregisonais.com: “Este doce conventual foi trazido por um espanhol, de nome Francisco Muñoz Gomes (Paco), cuja receita divulgou numa pastelaria que abriu quando, no início do séc. XX, foi viver para a Covilhã, uma cidade localizada na região centro de Portugal, junto à Serra da Estrela. Sempre fez questão de referir que a receita deste doce fora trazida de um convento e daí o nome (…). Este doce conventual caracteriza-se por ter fios de ovos enrolados, sob a forma de charuto, em capa de hóstia.
Pois é, caro leitor, as notícias são devastadoras… O Novo Acordo Ortográfico, armado até aos dentes, com a Base XV, nº 6, fez pontaria às “gargantas” indefesas e, num ápice, limpou-lhe os dois hífenes! Temos agora “gargantas de freira”. A designação continua a ser um composto. Mas assim, sem o apoio dos hífenes, apresenta-se aos nossos olhos, sensíveis e naturalmente conservadores, com o seu quê de fragilidade.
E o que justifica o impacável lifting? Isto: “Nas locuções de qualquer tipo, sejam elas substantivas, adjetivas, pronominais, adverbiais, prepositivas ou conjuncionais, não se emprega em geral o hífen, salvo algumas exceções já consagradas pelo uso (como é o caso de água-de-colónia, arco-da-velha, cor-de-rosa, mais-que-perfeito, pé-de-meia, ao deus-dará, à queima-roupa).” NAO, Base XV.
OU SEJA: LOCUÇÃO QUE NÃO É EXCEÇÃO NÃO ESCAPA À ALTERAÇÃO!
E não é tudo! Houve uma verdadeira razia que alterou para sempre no mundo da doçaria/pastelaria.
Só nesta curta lista de exemplos perderam-se 26 hífenes: barriga de freira, umbigo de freira, toucinho do céu, pão de ló, pão de Deus, pão de leite, pão de rala, papos de anjo, queijinhos do céu, fios de ovos, trouxas de ovos, fatias da China e, com todo o respeito… maminhas de freira (iguaria já confecionada na Idade Média pelas monjas cistercienses do Convento de Celas em Coimbra).
 
Despeço-me com beijos de freira, desejando a todos bons sonhos... de freira! (Clique nos beijos e nos sonhos e não resista à tentação...)
AP
 
SABIA?
"Portugal sempre teve uma grande produção ovícola, sendo mesmo o principal produtor de ovos da Europa entre os séculos XVIII e XIX. Grande parte da clara era exportada e usada como purificador na produção de vinho branco ou ainda para engomar os fatos elegantes dos homens mais ricos, nas principais cidades do mundo ocidental. Com tantas claras a serem utilizadas para diversos fins, havia um grande excedente de gemas. Inicialmente, eram deitadas para o lixo quantidades imensas de gemas ou então dadas aos porcos.
A quantidade excedentária de gemas, aliada à abundância do açúcar que vinha das colónias portuguesas foi a inspiração para a criação de maravilhosas receitas de doces à base da gema de ovos, nas cozinhas dos conventos. Os nomes atribuídos aos doces conventuais estão, pois, relacionados com a vida conventual ou a fé católica." In  http://www.docesregionais.com/a-docaria-conventual-portuguesa (acedido em 24-10-12).


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