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O artigo de hoje vem na sequência da
mensagem que uma leitora brasileira me deixou na caixa de comentários:
Olá António,
Infelizente esse AO
deturpou a língua de Camões. As palavras com derivativos não deveriam perder as
consoantes. Exemplo: Egipto > egípcio , secção > seccional etc.
1. A língua
portuguesa já sofreu inúmeras “deturpações” desde a época de Camões…
2. A questão de
mantermos ou não as consoantes mudas conduz-nos ao confronto pronúncia-etimologia, que não é de agora.
2.1. A reforma de 1911 em
Portugal (adotada no Brasil cerca de 20 anos depois) seguiu a via da simplificação,
levando à queda de um elevado número de consoantes não pronunciadas: sciencia
> ciência (latim: scentia-);
prompto
> pronto (latim: promptu-); dipthongo >
ditongo
(latim: dipthongu-).
2.2. O Formulário
Ortográfico de 1943 (apenas aplicado no Brasil) ainda foi mais longe: óptimo > ótimo (latim: optimu-); excepto > exceto (latim: exceptu-); director > diretor (latim: directore); acção > ação (latim: actione),
etc.
Quanto a haver palavras da mesma família
com grafias diferentes, também não é uma situação nova na
língua. Já escrevíamos, por exemplo, dicionário
(latim: dictionariu-) e dicção, chama (latim: flamma-) e flamejante,
joelho (latim: genuc(u)lu ) e genuflexão, assunção (latim: assumptione-) e assumptivo, etc.
As histórias da evolução da língua e das
reformas ortográficas (por vezes forçadas e determinadas por razões políticas)
são complexas .
Tínhamos uma língua perfeita, lógica e
respeitadora da etimologia até há pouco tempo e foi o AO que veio deturpá-la? A
história da língua portuguesa mostra que não é assim.
Como já referi, a oficialização da “deturpação” tem mais de 100 anos e se quisermos recuar ainda mais no tempo, quase podemos dizer que ela vem do século III A. C. quando os Romanos invadem a Península Ibérica e disseminam o seu latim vulgar, bem popular e “deturpado”…
Como já referi, a oficialização da “deturpação” tem mais de 100 anos e se quisermos recuar ainda mais no tempo, quase podemos dizer que ela vem do século III A. C. quando os Romanos invadem a Península Ibérica e disseminam o seu latim vulgar, bem popular e “deturpado”…
Claro que os movimentos e opiniões anti ou pró-AO
são legítimos. No entanto, a melhor legitimação está no rigor dos
argumentos escolhidos. E há boas razões para se ser contra ou a favor do AO90!
Lamentavelmente, encontramos, em ambos os lados, justificações pouco recomendáveis: robustas na emoção, mas bem fraquitas na consistência…
Seja contra ou a favor o AO, desejo-lhe uma entrada
promissora em 2014!
António Pereira
P.s. Nada impede a Eliane de continuar a
escrever secção e seccional, uma vez que há uma dupla
grafia no Brasil (que já existia antes do AO).
Imagem encontrada AQUI.
Eu achei mais difícil a convivência com a retirada dos acentos, aprendemos de uma forma e agora eis que está tudo mudado.
ResponderExcluirBoa noite, Rita!
ExcluirAs mudanças são sempre difíceis de encaixar. No caso da acentuação, houve uma efetiva simplificação. Por exemplo, o trema já tinha sido abolido em Portugal em 1945. De qualquer modo, as alterações globais são, no Brasil, muito reduzidas: apenas 0,4% das palavras são afetadas.
Abraço e Bom Ano Novo!
António