No passado dia 14/2, deixei este comentário após uma
notícia sobre o AO:
"E, se não for
pedir muito, que o Portal da Língua Portuguesa e a Academia Brasileira de
Letras se ponham de acordo em relação à interpretação das regras e ponham termo
às divergências que encontramos nos respetivos vocabulários."
Hoje, um comentador anónimo questionou-me: “Há divergências entre os vocabulários?! Que divergências?”
Divergências será talvez um termo muito forte, mas há, sem dúvida, diferenças (que considero significativas), entre o VOP (Vocabulário Ortográfico do Português – Portal
da Língua Portuguesa) e o VOLP (Vocabulário
Ortográfico da Língua Portuguesa – Academia Brasileira de Letras). Em termos globais, a diferença é clara no número de entradas: 211000 no VOP e 381000 no VOLP.
1. Na regra relativa à hifenização das espécies botânicas e zoológicas, as
entradas do VOP são muitíssimo reduzidas,
sobretudo se as comparamos com as listas aprofundadas que o VOLP da Academia Brasileira apresenta.
2. Também a eliminação de hífenes na generalidade das locuções não é
operacionalizada da mesma forma pelos dois vocabulários. Enquanto a Academia do
Brasil aplica à letra o texto do Acordo, o Portal faz, na minha opinião, uma leitura “criativa” à
revelia do espírito simplificador que parece estar na base da nova regra.
Passemos aos
factos. Os exemplos não são exaustivos, mas mostram as diferenças que referi
no início desta mensagem.
A. Base XV, ponto 3:
“Emprega-se o hífen
nas palavras compostas que designam espécies botânicas e zoológicas, estejam ou
não ligadas por preposição ou qualquer outro elemento: abóbora-menina,
couve-flor, erva-doce, feijão-verde; (…)andorinha-grande, cobra-capelo,
formiga-branca; (…).”
Lancemos várias pesquisas com espécies botânicas e
zoológicas com nomes compostos e vejamos os resultados:
Entrada pesquisada
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Vocabulário-Portugal
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Vocabulário-Brasil
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feijão
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12 entradas
Não constam, por exemplo: feijão-branco, feijão-preto
ou feijão-manteiga.
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191 entradas
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espinafre
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1 entrada
Consta apenas espinafre-tropical,
uma espécie espontânea não comestível, mais conhecida como espadana-das-searas.
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7 entradas
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maçã
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0 entradas
Nem a maçã-reineta…
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29 entradas
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pera
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3 entradas
Nem a pera-rocha
nem espécies tradicionais como a pera-engana-rapazes
ou a pera-lambe-lhe-os-dedos,
definida no Diccionario de Lingua Portugueza
(de António de Morais Silva), em 1831, como “espécie de pera
mui gulosa, e succosa”.
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55 entradas
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tigre
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0 entradas
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11 entradas
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pardal
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6 entradas
Espécies comuns em Portugal como o pardal-espanhol ou o pardal-comum (conhecido como pardal-do-telhado)
voaram para parte incerta…
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25 entradas
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B. Base XV, ponto 6:
“Nas locuções de qualquer tipo, sejam elas substantivas, adjetivas,
pronominais, adverbiais, prepositivas ou conjuncionais, não se emprega em geral
o hífen, salvo algumas exceções já consagradas pelo uso (como é o caso de água-de-colónia, arco-da-velha, cor-de-rosa,
mais-que-perfeito, pé-de-meia, ao deus-dará, à queima-roupa).”
Esta é uma regra nova e, para mim, a mais interessante do Novo Acordo, pois
permite uma efetiva simplificação da hifenização. O texto parece claro. Vejamos
como os vocabulários o aplicam:
Entrada pesquisada
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Vocabulário-Portugal
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Vocabulário-Brasil
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cor-de-rosa (que já surge como exceção no
Acordo de 45).
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cor-de-rosa e…
cor de rosa!
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Apenas cor-de-rosa
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à vontade
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à vontade e…
à-vontade
O Portal manteve o hífen em à-vontade (nome), mas
não seguiu o mesmo princípio em dia a
dia, retirando-lhe os hífenes mesmo quando é nome.
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Apenas à
vontade
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Abraço.
AP